Dificuldades para se comunicar ou interagir com outras pessoas e o mundo ao redor são sinais de alerta para o transtorno do espectro autista (TEA). Esse distúrbio do neurodesenvolvimento humano afeta a linguagem e o comportamento de diversas formas e, por isso, merece um olhar especial dos profissionais de saúde.
O diagnóstico do autismo é feito de forma totalmente clínica: o médico examina as características físicas e mentais do paciente, avaliando o grau de comprometimento de funções cognitivas (como habilidades sociais, de comunicação) e executivas (como memória, flexibilidade, autocontrole).
Observação, entrevistas com o indivíduo e sua família e testes neuropsicológicos são as principais ferramentas para fechar o diagnóstico. Em alguns casos, porém, também podem ser solicitados exames genéticos para checar se, além do autismo, há mais alguma outra condição associada que precise de atenção.
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“Não existe um marcador biológico que diga se a pessoa é autista ou não”, afirma Rodrigo Fock, médico geneticista e membro da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica (SBGM). “Por isso, o diagnóstico é essencialmente clínico e baseado no comportamento do indivíduo — criança ou adulto”.
Em geral, quem suspeita fazer parte do espectro autista deve passar por uma avaliação multiprofissional, que pode incluir psiquiatra, psicólogo, neurologista, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, entre outros profissionais.
“Quando a investigação genética é solicitada pelo médica, não é para fechar o diagnóstico do autismo em si”, esclarece Fock. “Mas sim para procurar por alguma síndrome ou condição genética mais ampla, da qual o autismo seja uma das características.”
+ Leia também: A contribuição da investigação genética no diagnóstico do autismo
Quem deve fazer teste genético?
Estima-se que 20% das pessoas que fazem parte do espectro autista convivam com alguma doença ou síndrome genética, como a Síndrome do X Frágil, a Síndrome de Prader-Willi, a Síndrome de Angelman ou a esclerose tuberosa.
“Temos uma gama de condições muito extensa: alguns bancos de dados calculam que o autismo possa estar associado a mais de 300 síndromes genéticas”, ilustra Fock. “São doenças raras, mas quando olhadas em conjunto, elas correspondem a uma boa parte dos casos de autismo.”
Protocolos internacionais indicam que toda pessoa no espectro autista deveria ser investigada do ponto de vista genético. “Isso não quer dizer que, necessariamente, ela precise fazer exames genéticos, mas os profissionais que a acompanham devem sempre avaliar se há essa necessidade, atentando-se a alguns sinais”, informa o representante da SBGM.
Em geral, aqueles que precisam fazer uma investigação genética mais completa sobre indivíduos que, além do autismo, têm também outras condições, como:
“Ao encaminhar o paciente para o geneticista, é importante que o médico pediatra, psiquiatra ou neurologista que esteja acompanhando o caso faça uma descrição detalhada do quadro clínico, pois isso ajudará o especialista a direcionar o seu olhar e indicar o exame mais adequado”, pontua Rafael Malagoli, doutor em Patologia e fundador da Bioma Genetics, empresa brasileira de sequenciamento genético.
Com o diagnóstico em mãos, é possível orientar o tratamento mais adequado para cada doença ou síndrome rara — bem como entender melhor como o autismo está associado a essa condição.
+ Leia também: Aconselhamento genético: o que é e quando vale a pena procurar
Principais genes investigados
Há muitos genes ligados ao autismo e às centenas de doenças e síndromes raras que podem estar associadas a ele. Confira alguns dos mais conhecidos:
SHANK3: é um gene muito importante para o desenvolvimento neurológico e suas alterações estão associadas à Síndrome de Phelan-McDermid e ao autismo.
MECP2: outro gene essencial ao desenvolvimento cerebral e ao sistema nervoso como um todo. Por fazer parte do cromossomo X, alterações nesse gene afetam principalmente as meninas. Aquelas que carregam mutações podem desenvolver Síndrome de Rett e autismo.
CHD8: é um dos genes mais fortemente ligados ao autismo e a outros transtornos neurológicos. “Ele está envolvido na regulação da expressão de outros genes durante o desenvolvimento do cérebro, do sistema nervoso central”, explica Malagoli.
SCN2A: é responsável pelo funcionamento dos canais de sódio dos neurônios, influenciando a transmissão de sinais neuronais. Alterações nesse gene podem prejudicam o sistema e levar a problemas relacionados à epilepsia e ao transtorno do espectro autista (TEA).
PTEN: associado à ocorrência conjunta de macrocefalia e autismo.
+ Leia também: EUA vão mesmo descobrir as causas do autismo até setembro?
De pai pra filho?
Enquanto uma a cada cinco pessoas no espectro autista tem também uma síndrome ou doença rara associada à condição, a grande maioria dos casos se enquadra no chamado “autismo essencial”.
“São casos que você até pode encontrar alguns genes de predisposição ao autismo, mas não uma causa específica”, explica Fock.
Nesse contexto, é interessante conhecer os conceitos de herdabilidade e hereditariedade. A herdabilidade diz respeito ao quanto a genética influencia o quadro. Já a hereditariedade se refere às chances de uma pessoa ter ou não um filho com autismo.
“A herdabilidade no autismo é muito alta, ou seja, a influência genética no desenvolvimento do transtorno chega à 90% — fatores ambientais podem influenciá-lo em menor medida”, explica o geneticista. Neste caso, as alterações genéticas ocorrem espontaneamente na formação do embrião.
Quando há uma herança de família, entra em cena a hereditariedade. “Ela varia de caso a caso. É uma análise que será diferente em cada família”
O aconselhamento genético é uma ferramenta válida para avaliar o risco em famílias com histórico do transtorno.
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